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Entendendo Bolsonaro

As raízes metafísicas da extrema direita: uma conversa com B. Teitelbaum

Entendendo Bolsonaro

30/08/2020 15h13

O pesquisador Benjamin Teitelbaum, estudioso da filosofia Tradicionalista, que inspira grandes figuras da extrema direita global, como Steve Bannon, Olavo de Carvalho e Alexander Dugin (Crédito: American Swedish Institute).

* Por: Leopoldo Cavalcante

Em conversas habituais, é comum utilizar a palavra tradicionalista para descrever um indivíduo preocupado com as mudanças de comportamento social de sua comunidade. Alguém apegado a modos do passado e temeroso de uma sociedade que, num curtíssimo espaço de tempo, parece ter abandonado o que seria a sua essência.

Mas há um outro Tradicionalismo, que vai muito além do comportamento social. O uso da letra maiúscula na palavra não é em vão. Trata-se de uma doutrina filosófica que atribui um sentido muito particular à existência humana e à natureza do tempo. Essa filosofia está presente nos círculos da extrema direita global, do qual o Brasil, junto com Estados Unidos, Rússia, Hungria, dentre outros, hoje faz parte.

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Em seu livro, "War for Eternity: Inside Bannon's Far-Right Circle of Global Power Brokers", publicado abril deste ano, Benjamin Teitelbaum, professor assistente de etnomusicologia e relações exteriores na Universidade de Colorado em Boulder, traça a influência do Tradicionalismo na política contemporânea, precisamente sobre algumas das figuras que são chave para compreender a extrema direita no mundo.

Além de aprofundar-se na vida e na biografia intelectual de Steve Bannon, Alexander Dugin e Olavo de Carvalho, todos com alguma passagem pelo Tradicionalismo, Teitelbaum também relembra casos na história recente, principalmente na Hungria, de membros dessa filosofia tentando entrar na política. Em geral, o pesquisador comenta: "eles não se importam em ganhar". E não ganhavam.

Com a ascensão dos populismos de extrema-direita, entretanto, o Tradicionalismo ganhou espaço na política institucional. Que essa filosofia ajudou a avançar pautas isolacionistas, nacionalistas e antimodernas, como a negação da pandemia de covid-19, não parece haver dúvidas. Mas, de acordo com o pesquisador, não se poder cair na tentação de supervalorizá-la.

Em conversa com o blog, Teitelbaum frisou como, acima de tudo, "essa é uma história sobre fracasso".

Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

O senhor apontou que o Olavo não é, e isso vai soar estranho, um Tradicionalista tradicional. Em uma passagem do seu livro, ele é classificado mais como um comentador e um acadêmico independente do que um filósofo.

Essas são atribuições da sua vida profissional. Ele gosta de falar de seus estudantes, de ser professor. Mas o modo como ele entrou em contato com Bolsonaro foi por seus comentários na esfera pública. Eu não sei se Bolsonaro já ouviu falar de René Guénon [autor esotérico francês e uma das principais inspirações do Tradicionalismo], por exemplo. Eu adoraria estar lá para esse encontro.

Parte do que é interessante no Olavo é a combinação de sua persona. Ele tem crenças filosóficas tangíveis e concepções sobre o mundo, e ele também é um jornalista, um comentador e uma personalidade nas redes sociais.

Eu acho que a influência do Tradicionalismo é visível no modo que ele escreve e pensa, mesmo ele não querendo ser identificado como Tradicionalista. Ele se coloca como católico. Talvez como anticomunista, ou antimarxista, também. Mas ele realmente só quer ser uma pessoa livre de qualquer amarra. É por isso que ele recusou uma posição no governo Bolsonaro. Ele não queria fazer parte de uma coletividade.

Deve ser por isso que ele reage tanto à palavra "círculo" no meu livro; tendo quase uma reação manicomial. Ele quer ser confuso e único. E ele quase é.

Seguindo nessa linha, a imprensa não sabe bem como chamar Olavo de Carvalho. Devemos designá-lo como filósofo, escritor, professor, youtuber ou influenciador? Todos juntos? Só os últimos dois? Mesmo assim, ele continua sendo o intelectual mais influente na política brasileira atual.

Tem muito a ser discutido sobre isso. O que você acabou de descrever é uma síntese do próprio Olavo. Não dá para caracterizá-lo bem. Sua história de vida também é muito confusa. Ele agrupou identidades muito contraditórias. Esqueça a política e os comentários que ele solta. Olavo já viveu tantas identidades em sua vida. Adicione também o fato que ele investiu na ideia de ele mesmo ser um indivíduo completamente único. De certa forma, isso o torna fascinante. Com certeza, tornou-o fascinante para mim, como escritor.

Sua apresentação da vida regressa de Olavo, como membro da tariqa [organização esotérica com inspiração islâmica] e ligado a Frithjof Schuon [filósofo suíço, da tradição perenialista de René Guenon], parece ter feito com que ele voltasse a falar dessa época. Não era um assunto tão comentado por ele. No entanto, em entrevista para a BBC Brasil, publicada em maio desse ano, Olavo fala do senhor e esclarece essa passagem mais obscura da própria vida de maneira quase voluntária.

Quando eu estava pesquisando para o livro, eu me perguntava o quanto os brasileiros sabem desse passado. Não que eu ache que seja um escândalo – que alguém deva ser odiado ou escarnecido por causa disso necessariamente. Eu percebi que ele escreveu algumas vezes sobre sua relação com o islã e com Frithjof Schuon quase como piada. Uma delas é quando ele escreveu algo na linha de: "Talvez eu possa superar a minha história na tariqa, mas eu nunca limparei a mácula de ter sido jornalista".

Enfim… Eu me perguntava se seus seguidores, ou um brasileiro médio, teriam a mínima noção do que é uma tariqa. A maior parte dos americanos não tem a menor ideia. Não é parte do nosso vocabulário. Então eu parti do pressuposto de que isso não seria conhecimento comum.

No primeiro capitulo do seu livro, o senhor diz: "Estudar radicais da direita contemporânea é estudar o movimento politico mais transformador do início do século XXI. É testemunhar a história". O que ela nos mostrou até agora?

Boa pergunta. Vamos voltar para o começo do século. Esqueça Dugin, Bannon e Olavo – e também Gabor Vona e Tibor Baranyi, na Hungria. O populismo de direita impôs a maior ameaça ao liberalismo – no sentido de direitos individuais e democracia liberal – em décadas. Desde a Segunda Guerra Mundial. E fez isso operando pela democracia, não contra ela. É uma situação inédita, historicamente.

Seria uma conclusão muito conservadora dizer que isso mostra uma diversidade na atração exercida pelo populismo de direita. Apoiando essa direita, nós vemos tanto banqueiros ricos quanto massas rurais sem instrução.

Aliás, nós vemos também ocultistas. Eles encontraram seu modo de fazer parte dessa causa. Isso mostra quão abrangente ela é. Mas se limitar a isso não explica por que todos eles estão em posição de poder, emanando um mesmo tipo de soft-power intangível.

A direita transformou potencialmente – ou tentou, pelo menos – a direção óbvia que a história estava tomando, a saber, integração entre povos, aumento das políticas estatais, crescimento de entidades políticas e a globalização. Só isso já a torna especial.

Qual o apelo do Tradicionalismo nessa grande história da direita radical contemporânea?

Vamos voltar um pouco. O que fazer com o fato de que essa ideologia política chamada de Tradicionalismo não é uma ideologia política? Ela foi forçada dentro da política – mas não é política. O que fazemos do fato de que o mesmo tipo de figura, mais ou menos, brotou em vários lugares? É uma grande pergunta.

Eu não sei. Eu não sei se fecho essa pergunta no livro. Ainda estou estarrecido com isso. Não tenho certeza se a atração ao Tradicionalismo tem a ver com o fato de que nos mais altos níveis de poder você vai ter pessoas que são tão radicais e que buscam ir tão mais longe do mainstream que elas acabam encontrando caminho para o Tradicionalismo. É uma possibilidade. Afinal, é uma filosofia que combina radicalismo e a vontade de se libertar do status quo.

Olhar além do comunismo, liberalismo, democracia – até mesmo do fascismo, em certo sentido –, encontrar algo completamente novo. Isso pode ser o que está acontecendo, mas eu não tenho certeza.

No final do livro, o senhor fala sobre um político de direita sueco que comemora a mudança de foco nas discussões políticas. Ele estava feliz que os capitalistas e os socialistas se juntaram contra ele. Essa união significou, para ele, que questões de política pública (policies) estavam se tornando menos relevantes no debate político, o que, para ele, seria impensável. Mesmo com esse caso, não parece que o senhor concorde que o Tradicionalismo se consolidou em um modo de pensar sobre a política. Estou certo?

Apenas um pequeno esclarecimento. O político sueco não estava falando em política no sentido amplo, mas em econômica política. Ele estava feliz porque viu que as questões fundamentais para a política sueca – que também são as questões fundamentais para a política americana –, como as maneiras de distribuir renda, público versus privado, financiamento, tributação… Todas essas disputas estavam se tornando menos importantes. E elas foram substituídas por identidade. Por política imaterial. Ele disse que não se importa em ganhar ou perder a eleição, porque, se essa transição acontecer, então toda a política estaria indo na direção dele.

Alguns resenhistas entenderam errado a mensagem do meu livro. Eles assumiram que essa era uma história que terminava comigo dizendo: "Ok, o Tradicionalismo vai tomar conta do mundo e de toda a política". Eu concordo completamente com você. Essa é uma história de fracasso. O Tradicionalismo não irá reconhecer a política. Ele ignora a política. Ele não tem muito a dizer sobre políticas públicas. Qual é a posição de um Tradicionalista sobre sistema de saúde público? Alguém poderia vir com alguma resposta, mas não acho que passaria muita firmeza.

Eu também aponto no livro que, na maior parte das vezes – especialmente na Hungria –, quando um Tradicionalista entrou em um partido político, não deu muito certo. Eles não se importam em ganhar, tampouco em ter qualquer encanto.

Há essa incompreensão sobre o Tradicionalismo, algo que o senhor já havia apontado. Não é uma ideologia política, é uma filosofia. Aspectos do Tradicionalismo não se misturam com facilidade à sociedade política. Mas, ao mesmo tempo, podemos ver partes dessa filosofia acontecendo. A antiglobalização, a luta contra a modernidade… Essas são pautas que o tornam menos intangíveis. Observamos essas ideias, por exemplo, nas políticas de Ernesto Araújo, chanceler brasileiro. Externamente contra o globalismo e os órgãos internacionais. Internamente, transformando uma fundação de pesquisa do Itamaraty em think tank "olavista", espalhando conpirações sobre a pandemia de covid-19 e fomentando o nacionalismo em um órgão diplomático.

Olavo me disse (eu tenho a gravação, e ele também) que o Ernesto é mais Tradicionalista do que ele. Ernesto consegue discutir Alexander Dugin [teórico russo, com grandes influências sobre o Kremlin] e a crise do mundo moderno de René Guenon inteligivelmente. Eu não acho que o Tradicionalismo seja politicamente neutro. Eu não acho que seja uma folha de papel em branco. Em seu nível mais fundamental, é uma crítica ao progresso, ao individualismo e à igualdade. Se temos uma espiritualidade que é oposta ao progresso e que não gosta de individualismo, tampouco igualdade, ela não pode simplesmente ser considerada neutra.

Não é esperado que essa filosofia, ou espiritualidade, seja acreditada e seguida por qualquer pessoa. Se ela for se manifestar na política, irá ser à direita. Ao menos nos moldes como nosso espectro político funciona atualmente. É por isso que eu não tenho tanta paciência para Tradicionalistas que falam: "Isso [ser considerado de direita] é Alexander Dugin destruindo nossa filosofia", "Julius Evola foi um Tradicionalista de mentira e nunca deveria ter sido levado a sério…". Eu não compro essas ideias.

Nos Estados Unidos, Steve Bannon foi perdendo espaço na Casa Branca até, eventualmente, voltar a sua profissão anterior: um comentador político. O vínculo mais forte entre o Tradicionalismo e a política norte-americana, parece, foi rompido. No Brasil, entretanto ainda temos uma união com a "ala católica" do Tradicionalismo. A pergunta, portanto, é: por que esse tipo de pensamento perdeu a relevância nos círculos de poder americano e por aqui continua com alguma solidez?

Odeio responder assim, mas eu não acho que seja uma comparação tão simples de se fazer. Podemos nos perguntar o que aconteceria se os filhos do Bolsonaro odiassem tanto o Olavo como os de Trump odeiam Bannon. As circunstâncias são diferentes. Também poderíamos apontar que o Olavo não pode ser demitido. Ele não pode ser chutado para fora do governo porque ele não está no governo.

É muito difícil medir a influência de Steve Bannon. Não acredito em quem fala que ele é completamente irrelevante, mas também não compro a ideia de que ele seja algum tipo de mestre secreto por trás dos fantoches, controlando o futuro dos Estados Unidos e do mundo.

Personalidades importam, também. Trump realizou mais trocas de cargos em seu governo do que qualquer outro presidente na história moderna dos EUA. Ele demitiu pessoas a torto e a direito… Eu sei que Bolsonaro teve um nível alto de demissões, mas em Trump foi excepcional. Outro aspecto é que Olavo é uma figura mais pública do que Bannon. Não é como se Bannon não fosse faminto por atenção. Ele trabalha bastante para conseguir colocar seu nome nos jornais e na televisão o tempo todo, não entenda errado. Ele é bom nisso. Mas, diferentemente do Olavo, raramente Bannon fala o que pensa e tem suas opiniões escutadas em grande escala. Essa é uma diferença.

Steve Bannon gosta mesmo é de ser um influenciador oculto. Claro que ele quer ser conhecido, mas é diferente ao Olavo, que – até onde eu sei –, não tem o mesmo tipo de influência por trás das cortinas que Bannon. Eles podem ser vistos como dois tipos distintos de metapolítica [modo de fazer política focado em alterar as percepções culturais da sociedade].

Tradicionalismo e capitalismo não se dão bem. No seu livro, tem uma passagem na qual Steve Bannon, em 2014, ainda pouco conhecido, palestra para conservadores católicos sobre como o capitalismo deveria estar subordinado à espiritualidade. Como, mesmo com todas as críticas a esse sistema, o senhor observa a junção da defesa do capitalismo com os preceitos do Tradicionalismo tanto no Brasil quanto nos EUA?

Excelente pergunta. Peço desculpas por não ter uma resposta fácil, também. Vejo dessa maneira: ou a oposição ao capitalismo é priorizada, ou é negociável. Ou seja, havendo um problema maior do que o capitalismo, então é possível se aliar com os capitalistas. Se observamos as figuras mais importantes do Tradicionalismo, é isso que elas estão fazendo. Alexander Dugin vai lhe dizer que esse não é o seu caso. Mas é. Um dos seus principais financiadores é um capitalista oligarca.

Para alguém como Olavo, capitalismo também serve como uma causa para se opor ao comunismo e à China. É muito importante, para gente como Ernesto Araújo, que o capitalismo não seja o objetivo final, como o é para a maior parte dos conservadores dos Estados Unidos. Ele diz que o problema com o comunismo na China não é a ausência de capitalismo. No limite, é que o modelo chinês é "antiespiritual". Ou seja, é oposto ao espírito.

Para eles, o capitalismo é uma ferramenta para lutar outra batalha. Mas todos são opostos ao capitalismo enquanto homogeneizador e "destruidor de fronteiras". Digo, no sentido de livre-comércio. O sistema capitalista pode ajudar em pontos particulares, mas ambos, Bannon e Olavo, querem ver a "elite econômica global" e o "capitalismo internacional" subjugados à religião, à espiritualidade e ao nacionalismo.

Nem todos os Tradicionalistas estariam dispostos a ir tão longe com o capitalismo. Até mesmo quando ele acontece dentro de uma comunidade religiosamente homogênea e devota à sua nação, o capitalismo continua priorizando o material sobre o espiritual.

Mesmo assim, parece que esses pensadores [Tradicionalistas como Araújo] estão dispostos a vê-lo como uma ferramenta útil a longo prazo.

Alexander Dugin elogiou a identidade brasileira por sua miscigenação e viu na população indígena altos níveis de antimodernidade que lhe agradara. Ao mesmo tempo, Ernesto Araújo, em seu famoso ensaio "Trump e o Ocidente", ressalta não os povos nativos, mas o vínculo com o Ocidente europeu católico – especialmente Portugal. Ambos valorizam o mesmo país, mas não parecem estar falando da mesma nação. Entre Tradicionalistas, é possível haver um consenso sobre a essência de um país, ou melhor, Estado-Nação?

Essa é uma questão de onde são traçadas as linhas. Isso acontece com o nacionalismo também. Haverá uma cultura majoritária a qual todo mundo deverá assimilar e ser assimilado? Seria a do Estado-Nação? Olhe para o globo, para o mapa… As fronteiras que ilustram os Estados-Nação indicam alguma resposta? Ou há vários "miniglobalismos" que apagam a verdadeira essência de diferentes povos?

Dugin gosta da esquerda brasileira em parte por causa da questão dos povos indígenas. Ele vê as tribos ameríndios da Amazônia como sendo antimodernistas, ou pré-modernas, e gosta de suas peculiaridades. Essa é uma porta para seu modo de pensar o mundo em muitos níveis diferentes. Mas mesmo na Amazônia há imperialismos e assimilações. Dessa forma, alguém poderia rebater Dugin por ele não ter reconhecido um limite ainda mais específico.

Esse é um dos grandes problemas de falar em fazer política baseado no Dasein, o ser-no-mundo. Ela evita a questão maior, que é justamente perguntar "o que é o Dasein?" e "onde fincam-se essas fronteiras?" Não poder especificar é um problema.

Eu não dispenso a ideia de que há culturas e modos de observar o mundo que são formados pelas coletividades. Mas isso sempre se mostrou um grande problema, especialmente por políticos que querem reestruturar as sociedades a partir dessas essências. Todo nacionalismo é sobre isso. Subitamente, os detalhes significam tudo. Onde vamos demarcar os limites? O que qualifica o Dasein? O que não é parte do Dasein?

Desse modo, adornar tudo em um esoterismo é retirar a questão do plano no qual é possível conversar sobre isso, ter uma conversa concreta sobre o assunto.

Para finalizar, em certo momento o senhor escreve sobre uma maneira quase marxista, ao supervalorizar o trabalhador rural e braçal, com a qual Bannon e Olavo falam sobre "o povo". Poderia aprofundar essa questão?

Quem é realmente o povo? Tipicamente, quando ideólogos querem delimitar o povo, eles estão falando sobre quem eles acreditam ser o mais autêntico, o mais representativo. A questão fica mais complexa pelas duas instruções do Tradicionalismo para respondê-la.

De um lado, você tem a hierarquia, vinda do hinduísmo. A maioria da massa, e em especial aqueles envolvidos mais diretamente em trabalhos braçais, não é boa. No sentido de que ela não é o povo. Eles não deveriam ser a casta ideal para formular a identidade de uma sociedade. Quem deveria fazer isso são os sacerdotes, ou seja, o topo.

Por outro lado, temos uma outra vertente do pensamento Tradicionalista que defende uma inversão. Para eles, como as coisas se mostram atualmente, quaisquer hierarquias que nós temos agora são o oposto do que elas deveriam ser. Portanto, quem deveria ter preferência ao prestígio e ao poder é o exato oposto das pessoas que as possuem nesse momento.

Ilustrando, os privilegiados no nosso mundo atual são as pessoas que têm poder em virtude de serem boas em jogar o jogo da modernidade, educando-se em universidades, angariando qualificações etc. Ao realizar essas ações, ou seja, jogar o jogo da modernidade, elas simbolizam que não são autenticamente o povo, a identidade ideal, mesmo estando no topo da escala social.

Unindo essas duas visões, o que se conclui é que os sacerdotes estarão entre os trabalhadores braçais, as massas. Dessa forma, esse mundo no qual vivemos está de cabeça para baixo.

Onde as coisas realmente divergem do Tradicionalismo é quando Steve Bannon fala em ajudar o povo/os sacerdotes/os trabalhadores dando-lhes dinheiro. Essa é a visão de Steve Bannon. Ela não está em consonância com o padrão no Tradicionalismo. Dizer que o melhor jeito de ajudar o povo a encontrar seu verdadeiro ser é dando dinheiro não é nem um pouco Tradicionalista. Isso já seria "pós-Tradicionalismo".

* Leopoldo Cavalcante é graduando em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero. Edita a revita literária Aboio.


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